Desde a quarta-feira (24/11), fotos e vídeos feitos no rio Madeira, a pouco mais de 120 km de Manaus, causaram indignação no Brasil e no exterior.

As imagens mostram verdadeiras “barreiras” formadas por balsas de garimpo de ouro em uma região próxima ao município de Autazes, no interior do Amazonas.

Especialistas explicam que a “invasão” do rio Madeira por garimpeiros ilegais acontece por uma conjunção de fatores como: aumento no preço do ouro, queda na fiscalização ambiental, discursos e ações governamentais simpáticas à atividade e facilidade para “esquentar” o ouro ilegal.

As imagens do rio Madeira chamaram atenção porque evidenciam o avanço dos garimpos ilegais nos rios da Amazônia, movimento que ocorre há vários anos, mas que ambientalistas afirmam que se intensificou durante o governo do presidente Jair Bolsonaro.

Os registros foram feitos pela ONG Greenpeace, que monitora a região há anos. A preocupação é com os danos ambientais e com saúde pública da população abastecida pelo rio, entre elas, povos indígenas que vivem na região.

A extração ilegal de ouro acontece com a utilização de balsas que são verdadeiras dragas que reviram o leito do rio em busca de ouro.

Para separar o minério das impurezas, eles frequentemente utilizam o mercúrio, uma substância tóxica que é jogada na água e causa danos a toda à cadeia alimentar. O metal tem efeito cumulativo e pode causar doenças neurológicas.

Em um áudio atribuídos a garimpeiros da região pelo jornal O Estado de S. Paulo, um homem desafia as autoridades e diz que seria necessário montar um “paredão” de balsas para que eles fossem respeitados.

Em meio à comoção causada pela divulgação das imagens, o Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas divulgou uma recomendação pedindo ações emergenciais para a retirada das balsas.o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) disse que uma ação de combate aos garimpeiros ilegais está sendo organizada pela Polícia Federal na região e deverá ser deflagrada nos próximos dias.

Mas como a situação chegou a esse ponto?

Histórico de atividade garimpeira no rio Madeira

Os garimpos ilegais no rio Madeira não são uma novidade. A atividade vem sendo exercida na região há décadas, mas, inicialmente, ela se concentrava mais próxima ao Estado de Rondônia, que também é cortado pelo rio.

Agora, ela vem avançando também pelo território do Amazonas, mais especificamente entre os municípios de Borba, Nova Olinda do Norte, Novo Aripuanã e Autazes.

Em grupos organizados em redes sociais, os garimpeiros classificam os anos 1980 como o “auge” dessa atividade, quando milhares de pessoas foram atraídas pela promessa de ouro fácil e rápido.

O Madeira é famoso por supostamente ter enormes depósitos de ouro em seu leito.

Para extraí-lo, eles quase sempre recorrem a mergulhadores que ajudam a derrubar barrancos de terra e a puxá-los com bombas de sucção para a superfície.

Essa atividade é extremamente perigosa, e há inúmeros relatos de mergulhadores que morreram atingidos por barrancos que desmoronaram ou por toras de madeira que os atingiram enquanto estavam submersos.

Na balsa, essa terra é “lavada” e passada por um conjunto de esteiras que separam o ouro de outros sedimentos. A purificação do ouro é feita com mercúrio.

Em torno dessa “tradição” garimpeira do rio Madeira, se organiza uma complexa cadeia de fornecedores de insumos, equipamentos e mão-de-obra.

“A região do Madeira é conhecida por essa atividade garimpeira. Isso acaba gerando toda uma rede de abastecimento que é ativada em momentos como esse”, afirma Carlos Ritll, especialista em políticas públicas da Rainforest Foundation, da Noruega.

Queda na fiscalização

Um terceiro fator responsável pelo aumento na quantidade de garimpeiros na região é a queda nos números da fiscalização ambiental em todo o país.

O rio Madeira corta Rondônia e Amazonas. Por isso, é considerado um rio “federal”, o que significa que a fiscalização no seu curso é responsabilidade de órgãos nacionais como o Ibama, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Polícia Federal.

Uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) divulgada em junho deste ano mostra que houve uma queda de 43,5% na média anual de multas aplicadas pelo Ibama na Amazônia entre os anos de 2019 e 2020 na comparação com o período entre 2012 e 2018.

Rodrigues aponta um quinto elemento que, segundo ela, também contribui para o avanço do garimpo: a facilidade para colocar ouro de origem ilegal no mercado formal.

Ela explica que, atualmente, há garimpos legalizados atuando no Brasil, entretanto, uma grande quantidade de ouro comercializada no mercado formal tem origem ilegal.

Segundo ela, o processo para “esquentar” o ouro ilegal é extremamente simples. Basta levar o produto para uma distribuidora de títulos e valores mobiliários (DTVM) e preencher um formulário de papel informando que o ouro foi extraído em alguma área autorizada pela Agência Nacional de Mineração (ANM).

Como a lei prevê que essa transação foi feita de “boa-fé”, não há maiores exigências quanto a comprovação da origem do ouro. Uma vez vendido à DTVM, ela pode revendê-lo para outras empresas e até mesmo exportá-lo.

“A lei brasileira é muito leniente”, explica Rodrigues.

Um estudo do Instituto Escolhas aponta que, em 2020, o Brasil exportou 111 toneladas de ouro, mas 17% desse total (19 toneladas) seriam ilegais porque não tinham sua produção registrada ou não havia documentos que comprovassem que foram extraídos legalmente.

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